PÁGINA CULTURAL DE DIVERTIMENTO

Divirtam-se neste espaço onde não se ganha milhões de euros e ninguém fica rico! Este é um local de diversão e puro lazer onde a única riqueza se granjeia a fomentar e divulgar a amizade, a alegria e a liberdade de expressão — e lucrando-se, isso sim, montes de Companheirismo e Fraternidade! (RO)

domingo, 7 de dezembro de 2025

O CASO (sério) DA RUA das TRINAS ☝Edições Fora da Lei Novela de Dez Episódios -- 🕵️ Oito Autores - 2018 (TPL)

📚 Este é o vosso Blogue RO! 👦👧👨👩 👀

⌛🌷🚦 https://reporterdeocasiao.blogspot.com/🔍

🔦📂 reporter.de.ocasiao@gmail.com📱

💑 🎓 Concursos "Rainha” 👸 e “Rei” 🤴 🏰

"Homem" 👨 e "Mulher" 👩 dos "GOSTOS"!👌

 🧐 POLICIÁRIO 🕵🂧


 

 🔎 Novela Policiária 🔍 

 


EPISÓDIO 8 – A VIDA CONTINUA

Por: Búfalos Associados

 

     Quase dez anos tinham passado. Começara o ano de 1961 e a Rua das Trinas mantinha, no seu encanto lisboeta, o perfume das sardinheiras vermelhas que adornavam, por vezes um pouco fanadas, as janelas das velhas casas. Um estendal de roupa aqui, outro ali, gatos atentos atrás dos vidros e gaiolas com periquitos a apanhar sol quando o tempo o permite. A fauna humana não sofrera grandes alterações. As personagens que já conhecemos desta história, agora um pouco mais maduras, com as forçadas ausências já sabidas. O bairro fora acrescentado com algumas crianças que entretanto iam aparecendo à luz do dia, como mandam as leis da vida.


     O caso da Rua das Trinas continuava sem solução, porque nem o agente Anjinho nem quem o substituiu quando aquele se aposentou, conseguiram encontrar a solução para o problema que ameaçava tornar-se interminável. Já nessa época a justiça tardava a actuar. Convenhamos que ninguém parecia estar muito interessado em ajudar as investigações, o que não deixava de se tornar suspeito. Parecia que havia por ali muitas pedras nos sapatos. E a vida ia correndo sem sobressaltos de maior. Até um dia.

Anjinho tinha sido dispensado da Judite por manifesta falta de competência, sobretudo na condução deste caso. Mas, logo após a reforma, alguém o ouviu dizer para quem o quis ouvir: “Ah, que se eu pudesse falar... Eu sei muito bem o que se passou nas mortes do Tó Gula e do Quim Costa... Mas não posso dizer nada. Só me faltava saber se foram crimes passionais, políticos ou que tinham a ver com dinheiros... Só me faltava saber isso e o caso estava resolvido. Mas não me deram tempo.” Como está bem de ver, ninguém ligou muito a estas afirmações porque ninguém percebeu patavina. Para descanso de uns e revolta de outros.

Uma coisa foi sempre muito falada. O homem tinha estranhas relações. O Tóino Coxo, que entretanto arranjara um emprego de arrumador no cinema Chiado Terrasse, um dia em que estava à porta a tomar ar, viu passar o Anjinho e perguntou-lhe: “O que anda a fazer por aqui, senhor agente?”

– “Ah, vou ali ao fundo da rua, à sede do meu clube pagar as cotas” disse o outro meio atrapalhado.

– “Clube? Aqui?”

– “Sim. Aqui não é a rua António Maria Cardoso?”

– “É sim, vá lá, vá, que eu já sei qual é o seu clube...” E o outro raspou-se.

Algumas coisas se tinham passado no bairro. Foi claro para toda a gente que, de tantas vezes que se encontraram nos corredores da polícia ao longo de meses, passou a haver uma espécie de comunidade, feita de um misto de solidariedade e de desconfiança, entre os habitantes da rua. Alguns vizinhos maldosos chegaram mesmo a alcunhá-los de “O Gang das Trinas”.


     O mais feliz de todos foi o presidente do União, o Sr. Euclides, bafejado pela sorte que foi quando lhe saíram umas boas massas por ter acertado em cheio no totobola. A princípio não quis dar mostras de ter muito dinheiro, mas quando toda a gente percebeu que ali havia bago, desculpou-se dizendo que tinha vendido um ponta de lança ao Benfica. Qual ponta de lança? O União não tinha ponta por onde se lhe pegasse, quanto mais ponta de lança!

Até que um dia o segredo esfumou-se assim que ele anunciou um casamento de arromba com a Micas do Cu Grande, o qual até meteu passadeira vermelha na igreja do largo de S. Paulo. Ela é que não teve coragem para ir de branco por causa do falatório. Foi de verde alface. E o lauto copo de água, em que todos estiveram como convidados, foi no Caracol da Esperança, onde agora trabalhava a colega da Micas, a Josefa dos Prazeres. A certa altura da festa, o Euclides já muito bem bebido, perguntou-lhe se o nome dela seria Josefa Gustava dos Prazeres e Morais. A coisa não caiu bem, sobretudo na Micas, que estava sempre a pau, e pregou no noivo uma tal lambada nas ventas que obrigou a noite de núpcias a ter sido passada nas urgências do hospital de S. José. Aliás, com o passar do tempo, toda a gente percebeu que o homem daquele casal era a Micas, que trazia a rédea bem curta ao maridinho. Não eram poucas as discussões em público, sobretudo no café do Arnaldo, quando depois do jantar toda a gente ia beber a bica e ver a televisão.

E um dia, quando ela depois quatro ginjas de enfiada acusava o marido de ser um banana e de não ter autoridade na direcção do clube, berrou-lhe: – “Ai que se eu tivesse entre as pernas aqueles que tu tens!...” Ao que ele respondeu: – “Segurasse-os! Teve-os lá muita vez!"

Quem ficou roidinha de ciúmes com o casamento do Euclides foi a viúva Isaura, que nunca deixara de andar com o presidente debaixo de olho. Então depois do totobola ficou ainda mais raivosa com o homem. Ficou tão desesperada que até resolveu dedicar-se ao teatro quando lhe chegou aos ouvidos que na Sociedade Guilherme Cossoul andavam à procura de uma actriz com mamas grandes para entrar em “As Mamas de Tirésias" do Apolinaire. Mas não passou nos testes das tetas. Quem ficou foi a Adosinda que lhe ganhou por três centímetros cúbicos.

Já sabemos que a Isaura tinha tido duas filhas do falecido Quim Costa. Eram elas a Elvirinha e a Miquelina. A esta, como era franzinita, chamavam-lhe Micas do Cu Pequeno, por comparação com a outra Micas. A Elvirinha viera a casar com o Zé Torres das Finanças, bastante mais velho que ela mas que lhe garantia trazer para casa umas gorjetas dos serviços prestados a aldrabar nos impostos.


     A Albertina tinha deixado o Esticadinho, o qual, por não ter onde cair morto, acabou a sacar umas coroas a arrumar os carros dos deputados à frente do Parlamento, razão porque o alcunharam de “Deputedo”. Entretanto ela iniciou um caso com o Barbosa da Casa de Fados só que este, depois duma enorme falência, foi obrigado a fugir daqui. Como ainda sabia dedilhar menos mal uma guitarra, aceitou um contrato para andar embarcado a tocar na hora dos jantares nos paquetes da Companhia Colonial de Navegação.

Quem não se via livre da doença de não conter as águas à vista de uma farda era a Dona Umbelina. Tinha tido um namorado guarda-nocturno, um “sereno” à moda antiga com farda, chanfalho e tudo, mas teve de desistir de o ver à noite porque não se aguentava. Um dia que a tinham levado no dia 9 de Abril a ver uma parada militar na Avenida da Liberdade, a inundação foi tão grande que chegou à Tendinha do Rocio.

Mas o grande escândalo no bairro foi quando toda a gente percebeu que o padre Novena andava enrolado com a Graça do Bico. Dizia-se à boca cheia: “O padreca se calhar quis saber porque é que a ela chamavam “do Bico”. E se calhar conseguiu saber. E tomou-lhe o gosto."

Falta falar da Adosinda, a inconsolável viúva do esfaqueado Tó Gula. Essa veio a juntar os trapinhos com um professor de dança dos Alunos de Apolo que lhe andava a ensinar o “fox-trote”. Mas o seu sonho era vir a cantar no Festival da Canção. Até já tinha uma canção: “Trinas, tricas, meu amor”. Mas o bailarino passava a vida a dizer-lhe: “Ó mulher deixa-te disso que tu desafinas que nem um chicharro. Tu cantas em Ró maior!”

E foi exactamente nos Alunos de Apolo, numa noite de Janeiro durante a festa de aniversário da Adosinda para que todo o Gang das Trinas tinha sido convidado, que a coisa se deu. Ninguém faltou, a não ser os mortos e o embarcado Barbosa. Até os dois travestis, que agora eram seguranças do presidente de um clube da segunda divisão, lá estavam. A certa altura, numa pausa da música do conjunto “Os Biltres da Picheleira”, veio à baila a história dos crimes que há quase dez anos estavam por resolver. Os suspeitos eram mais do que muitos. A começar pelo João da Bica que tinha sido o último a ver o morto com vida. Choveram acusações de uns lados e de outros, até que o Anjinho, numa atitude digna de um verdadeiro Poirot, disse: “Querem saber toda a verdade? Pois eu vou revelar tudo o que sei e já não é sem tempo!”


     Mas nesta altura rompeu pela sala adentro o agente Faustino que tinha ido urinar, gritando como uma cabra: – “Que grande tragédia! A Dona Isaura está ali morta na casa de banho, enforcada com a corrente do autoclismo!”

Fez-se um silêncio sepulcral. Ninguém ousava mexer um dedo, nem soltar um ai. E no meio do silêncio vibrou a voz rouca do baterista do conjunto que tinha ido ao bar fumar um cigarro: “Apareceu agora ali na televisão o locutor a dizer muito agitado que um grupo de terroristas assaltou um paquete português que navegava nas Bahamas!”

– “Ai o meu Barbosa que anda lá embarcado pelas Caraíbas! Como é que se chamava o paquete?” – perguntou alarmada a Albertina.

O baterista ainda respondeu, mas ninguém ouviu porque toda gente estava já a correr para a casa de banho numa histeria colectiva.










 

VOLTAREMOS NO PRÓXIMO DOMINGO, 14 de Dezembro, com o Episódio n.º 9 - FINAL por: ZÉ.🧐


 


👌 FELIZ Domingo!


📔BOAS Leituras!