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EPISÓDIO 8 – A VIDA CONTINUA
Por: Búfalos Associados
Quase dez anos tinham passado. Começara o ano de 1961 e a Rua das Trinas mantinha, no seu encanto lisboeta, o perfume das sardinheiras vermelhas que adornavam, por vezes um pouco fanadas, as janelas das velhas casas. Um estendal de roupa aqui, outro ali, gatos atentos atrás dos vidros e gaiolas com periquitos a apanhar sol quando o tempo o permite. A fauna humana não sofrera grandes alterações. As personagens que já conhecemos desta história, agora um pouco mais maduras, com as forçadas ausências já sabidas. O bairro fora acrescentado com algumas crianças que entretanto iam aparecendo à luz do dia, como mandam as leis da vida.
Anjinho tinha sido dispensado da Judite por manifesta falta de competência, sobretudo na condução deste caso. Mas, logo após a reforma, alguém o ouviu dizer para quem o quis ouvir: − “Ah, que se eu pudesse falar... Eu sei muito bem o que se passou nas mortes do Tó Gula e do Quim Costa... Mas não posso dizer nada. Só me faltava saber se foram crimes passionais, políticos ou que tinham a ver com dinheiros... Só me faltava saber isso e o caso estava resolvido. Mas não me deram tempo.” Como está bem de ver, ninguém ligou muito a estas afirmações porque ninguém percebeu patavina. Para descanso de uns e revolta de outros.
Uma coisa foi sempre muito falada. O homem tinha estranhas relações. O Tóino Coxo, que entretanto arranjara um emprego de arrumador no cinema Chiado Terrasse, um dia em que estava à porta a tomar ar, viu passar o Anjinho e perguntou-lhe: −“O que anda a fazer por aqui, senhor agente?”
– “Ah, vou ali ao fundo da rua, à sede do meu clube pagar as cotas” − disse o outro meio atrapalhado.
– “Clube? Aqui?”
– “Sim. Aqui não é a rua António Maria Cardoso?”
– “É sim, vá lá, vá, que eu já sei qual é o seu clube...” E o outro raspou-se.
Algumas coisas se tinham passado no bairro. Foi claro para toda a gente que, de tantas vezes que se encontraram nos corredores da polícia ao longo de meses, passou a haver uma espécie de comunidade, feita de um misto de solidariedade e de desconfiança, entre os habitantes da rua. Alguns vizinhos maldosos chegaram mesmo a alcunhá-los de “O Gang das Trinas”.
Até que um dia o segredo esfumou-se assim que ele anunciou um casamento de arromba com a Micas do Cu Grande, o qual até meteu passadeira vermelha na igreja do largo de S. Paulo. Ela é que não teve coragem para ir de branco por causa do falatório. Foi de verde alface. E o lauto copo de água, em que todos estiveram como convidados, foi no Caracol da Esperança, onde agora trabalhava a colega da Micas, a Josefa dos Prazeres. A certa altura da festa, o Euclides já muito bem bebido, perguntou-lhe se o nome dela seria Josefa Gustava dos Prazeres e Morais. A coisa não caiu bem, sobretudo na Micas, que estava sempre a pau, e pregou no noivo uma tal lambada nas ventas que obrigou a noite de núpcias a ter sido passada nas urgências do hospital de S. José. Aliás, com o passar do tempo, toda a gente percebeu que o homem daquele casal era a Micas, que trazia a rédea bem curta ao maridinho. Não eram poucas as discussões em público, sobretudo no café do Arnaldo, quando depois do jantar toda a gente ia beber a bica e ver a televisão.
E um dia, quando ela depois quatro ginjas de enfiada acusava o marido de ser um banana e de não ter autoridade na direcção do clube, berrou-lhe: – “Ai que se eu tivesse entre as pernas aqueles que tu tens!...” Ao que ele respondeu: – “Segurasse-os! Teve-os lá muita vez!"
Quem ficou roidinha de ciúmes com o casamento do Euclides foi a viúva Isaura, que nunca deixara de andar com o presidente debaixo de olho. Então depois do totobola ficou ainda mais raivosa com o homem. Ficou tão desesperada que até resolveu dedicar-se ao teatro quando lhe chegou aos ouvidos que na Sociedade Guilherme Cossoul andavam à procura de uma actriz com mamas grandes para entrar em “As Mamas de Tirésias" do Apolinaire. Mas não passou nos testes das tetas. Quem ficou foi a Adosinda que lhe ganhou por três centímetros cúbicos.
Já sabemos que a Isaura tinha tido duas filhas do falecido Quim Costa. Eram elas a Elvirinha e a Miquelina. A esta, como era franzinita, chamavam-lhe Micas do Cu Pequeno, por comparação com a outra Micas. A Elvirinha viera a casar com o Zé Torres das Finanças, bastante mais velho que ela mas que lhe garantia trazer para casa umas gorjetas dos serviços prestados a aldrabar nos impostos.
Quem não se via livre da doença de não conter as águas à vista de uma farda era a Dona Umbelina. Tinha tido um namorado guarda-nocturno, um “sereno” à moda antiga com farda, chanfalho e tudo, mas teve de desistir de o ver à noite porque não se aguentava. Um dia que a tinham levado no dia 9 de Abril a ver uma parada militar na Avenida da Liberdade, a inundação foi tão grande que chegou à Tendinha do Rocio.
Mas o grande escândalo no bairro foi quando toda a gente percebeu que o padre Novena andava enrolado com a Graça do Bico. Dizia-se à boca cheia: −“O padreca se calhar quis saber porque é que a ela chamavam “do Bico”. E se calhar conseguiu saber. E tomou-lhe o gosto."
Falta falar da Adosinda, a inconsolável viúva do esfaqueado Tó Gula. Essa veio a juntar os trapinhos com um professor de dança dos Alunos de Apolo que lhe andava a ensinar o “fox-trote”. Mas o seu sonho era vir a cantar no Festival da Canção. Até já tinha uma canção: “Trinas, tricas, meu amor”. Mas o bailarino passava a vida a dizer-lhe: −“Ó mulher deixa-te disso que tu desafinas que nem um chicharro. Tu cantas em Ró maior!”
E foi exactamente nos Alunos de Apolo, numa noite de Janeiro durante a festa de aniversário da Adosinda para que todo o Gang das Trinas tinha sido convidado, que a coisa se deu. Ninguém faltou, a não ser os mortos e o embarcado Barbosa. Até os dois travestis, que agora eram seguranças do presidente de um clube da segunda divisão, lá estavam. A certa altura, numa pausa da música do conjunto “Os Biltres da Picheleira”, veio à baila a história dos crimes que há quase dez anos estavam por resolver. Os suspeitos eram mais do que muitos. A começar pelo João da Bica que tinha sido o último a ver o morto com vida. Choveram acusações de uns lados e de outros, até que o Anjinho, numa atitude digna de um verdadeiro Poirot, disse: − “Querem saber toda a verdade? Pois eu vou revelar tudo o que sei e já não é sem tempo!”
Fez-se um silêncio sepulcral. Ninguém ousava mexer um dedo, nem soltar um ai. E no meio do silêncio vibrou a voz rouca do baterista do conjunto que tinha ido ao bar fumar um cigarro: −“Apareceu agora ali na televisão o locutor a dizer muito agitado que um grupo de terroristas assaltou um paquete português que navegava nas Bahamas!”
– “Ai o meu Barbosa que anda lá embarcado pelas Caraíbas! Como é que se chamava o paquete?” – perguntou alarmada a Albertina.
O baterista ainda respondeu, mas ninguém ouviu porque toda gente estava já a correr para a casa de banho numa histeria colectiva.
👌 FELIZ Domingo!
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