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sábado, 31 de maio de 2025

👣 Primórdios da Problemística Policiária Portuguesa »»» PPPP »»» CORREIO POLICIAL - Domingos Cabral ☝ (Re)publicação -- "CORREIO POLICIAL" de: 21.MAI.2021

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 *** 36.ª Edição! 🧐 📖

 


PRIMÓRDIOS DA PROBLEMÍSTICA POLICIÁRIA PORTUGUESA

POR: DOMINGOS CABRAL

 

(CONTINUAÇÃO)

CICLO REINALDO FERREIRA – “REPÓRTER X” 


*  *  *  *  *

 

“OS 50 CONTOS MISTERIOSOS”

N.º 39 –  O CRIME DO ANTÓNIO CONSELHEIRO

- Hom’essa! Então… nunca ouviu falar do António Conselheiro? Pois admira! António Conselheiro pertence á História Contemporânea do Brazil… É mesmo um personagem invulgar. Palpitavam naquele coração todas as virtudes e todos os defeitos da raça – elevados ao mesmo exagero desequilibrado… Amoroso e odiento; dôce como cordeiro – feroz como hiena da selva; sanguinário até ao vampirismo – sentimental até á pieguice.

«Mas toda a gente conhece as proezas do António Conselheiro… Ele – depois do crime – conseguiu fanatisar todas aquelas regiões em redor – e daí é que lhe veio a fama. O governo, para o combater, foi obrigado a mobilisar tropas e mais tropas que se escapavam aos pântanos que empapavam os caminhos eram picadas a fôgo pelos fusis das suas guerrilhas. Tinham-no quasi por profeta – como aqueles “popes” ortodoxos que na Rússia dos czares chefiavam os operários e as virgens vermelhas contra os cossacos, erguendo o Cristo, como protector das turbas enlouquecidas.

“Mas… eu lhe conto a história… Foi há mais de trint’anos.”

“António Conselheiro, descendente de portuguezes, era viajante de comércio e percorria o norte do Brazil, montado só na egua e de carabina a tiracolo… Um dia enamorou-se… Era uma mocinha trigueira, de lânguido e dôce olhar, tão suave, tão leve, tão diáfana que a gente só lhe via a alma branca, esquecendo-se de admirar os encantos do seu corpito e do seu rosto apenas esboçados…

“Másculo, forte, guapão – António Conselheiro ajoelhou-se frente àquele Amor que nascia, como se fôra um altar… E ela sorriu-se. E ele casou…

“O mel do noivado assucarou várias luas – no mesmo calmo entusiasmo da primeira hora… E ele envaidecia-se… Se era uma santa aquela que compartilhara a sua vida – e que havia de alongar-se pela estrada, até á cruzilhada da Morte.

“A mãe de António tinha ido tratar do mal das saudades a Portugal, meses antes de ele conhecer a mulher. E quando regressou, amarga surpreza a aguardava… É que a mãe de António, de quem ele herdara a energia e a dureza de carácter – era senhora de áspero trato. Amava o filho com a animalidade ciumenta das leoas para os criar. E ao ver António casado, ao ver que o amor do filho se entronizava agora noutro amor mais forte e absorvente, uma epilepsia furiosa a convulsionou…

“Mas depois conteve-se. Que argumento podia ela opor contra o facto consumado do casamento de António? Resignou-se, na aparência, mas o ódio ficou refervendo ondas de ódio, no seu silêncio carrancudo…

“Dar-se mal com a nora – seria para ela a delícia de um Paraíso! Mas quê! Se a nora era humilde e atenta e queria afôfar de atenções e carinhos o chão que ela pisava!

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“A felicidade de António estoirava dentro das paredes limitadas do seu peito… Tinha a mulher… Tinha a mãe… E por isso, findas as caminhadas de comércio pelos seringaes, através das florestas ao longo dos rios, espaçosos como oceanos, fechava-se em casa, como Noé na sua barca…

“Visitas não tinha… Apenas dois vizinhos o frequentavam ás vezes: o Jordão, mulato agigantado e o coxo Cabrita, que perdera a perna direita, numa emboscada de índios, lá pr’a o sertão!

“Um dia, à volta do negócio, após uma semana de ausência, a mãe chamou-o de parte, mal ele chegou a casa. A velha, que roçava pelos sessenta, rija e ágil ainda, mas pequenina, quase pigmeia, torna-se seca, côncava, escanzelada de tanto se consumir na sua ruindade.

“– Ouve, António… É muito sério o que eu te vou dizer. Se não fosses meu filho, calava-me… Mas como as tuas vergonhas, minhas são, também devo prevenir-te…

“António não se alarmou… A paz imensa que pousava dentro dele não podia arrugar-se assim, com meias palavras…

“– Diga mãe…

“– A tua mulher tem conferências com um homem que te quer matar.

“O corpo de António contorcionou-se como o dum electrocutado… Foi preciso que a velha lhe repetisse duas vezes a mesma frase…

“– Oh! minha mãe… Não é possível… Ela é uma santa…

“– Tem-nos engano a todos… Eu que t’o digo é porque sei… Não ia caluniar essa velhaca se não tivesse a certeza…

“– Mas… tem a certeza, mãe?

“– Tenho… Se eu a vi falar com esse homem! Se tu podes ver, se quiseres…

“– E com quem. Se aqui, nesses sítios, poucos são os homens… O Jordão? Cabrita?

“– Não sei… Tu verás…

E cochichou-lhe ao ouvido:

“– Finge que tens de partir hoje mesmo. E logo á noite esconde-te no fundo do quintal e espera!

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“António dissimulou como poude a tempestade que lhe ia n’alma; beijou á pressa a mulher, acavalou-se na égua e lá foi outra vez, de alongada, com a carabina a tiracolo…

“Esperou pela noite; voltou ao logar; ladeou a casa e pulando o muro foi esconder-se dentro da sombra coagulada.

“Esperou… Da igreja vinham, de tempos a tempos, as badaladas das horas, medindo o tempo que lentamente o ia levando para o crime… Ás onze em ponto ouviu-se uma restolhada… Enclavinhou as mãos na arma – e esgaziando os olhos distingiu um vulto pequeno, seco, trajando um fato igual ao seu, muito embuçado que, aproximando-se duma janela do rés-do-chão, afastou sem ruído os batentes… E teria entrado, talvez, se uma bala não o picasse de morte, pondo um grito de tragédia no silêncio da noite…

“António correu para o cadáver com a coronha do fuzil no ar para esmagar o crânio onde germinara a ideia de o matar… E ao acercar-se-lhe viu então que era…

                 

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“OS 50 CONTOS MISTERIOSOS”

N.º 40 – AS SUICIDAS JAPONEZAS

Era longo, o corredor do terceiro andar – no Hotel Europa de Tokio. Formava um hotel, ele só – sem necessidade dos outros andares. E para que essa dependência fosse completa, não faltava, nem o salão, nem o “fumoir”, nem o “grill-room”.

Houvera, naquele dia, no Hotel Europa, um desusado movimento… É que se festejara o aniversario natalicio do embaixador italiano. No Japão, como aliás em todos os paizes asiaticos, o corpo diplomático, diferente, fisica e moralmente  dos naturaes, forma outro estado, amassado, unido, isolado… Ministros, cônsules, secretários, adidos, criam, involuntariamente, uma maçonaria: a maçonaria da raça…

O Mikado estava agonizante. Todo o Japão deixara apagar a maquillagem europeia sob as lagrimas da sua dôr de fanaticos. Os jornais tinham iniciado uma nova secção: a secção dos suicidas; dos suicidas que, como os samoraes da Idade Media, achavam que deviam morrer – quando morresse o seu imperador. E alguns, anteciparam-se para chegarem primeiro ao Mundo da Luz – talvez para preparar ao soberano a recpção dos Céus.

Tinha proibido toda a alegria – no Imperio do Sol Nascente. Teatros, cinemas, clubs, palacios aristocraticos de  frequente festança, mantinham as suas janelas severamentre cerradas… Era o luto que na Europa é negro e no Japão é branco, que se estendia já sobre todo  o arquipelago.

Os diplomatas, artificialmente interessados na luta da vida contra a morte, travada na alcova imperial, não queriam perder o pretexto dos anos do embaixador italiano para se reunirem e beberem “champagne”… E para não ferir o dictatorial protocolo imperiosos – conjuraram um banquete, á porta fechada, nos aposentos do ministro da Servia, instalado no Hotel Europa…

Eram quarenta os convivas – mas o salão do diplomata balcânico podia abrigá-los á vontade, de espaçoso que era. Media talvez uns quarenta metros quadrados e tinha rasgadas, sobre a avenida, quatro janelas largas… As estantes serviam de “bufete”; e na panóplia, cheia de facas de refulgentes laminas – prodígios da cutelaria de Belgrado – tinham pouzado as asas de dezenas de fitas com as côres da bandeira italiana.

O jantar tinha sido uma pequena orgia – orgia em surdina, para que os japonezes não se escandalisassem. As próprias gargalhadas eram abafadas pelos guardanapos, que colavam aos lábios, a servir de mordaça.

    Findo o jantar, todos vieram para o “fumoir”, afivelando a mascara de falsa angustia. Só um – entre tantos era sincero na sua preocupação: o ministro da Finlandia.

- Que tens tu hoje, Yvan – indagou um dos diplomatas.

- Tu sabes que vivo neste paiz ha quinze anos. Sabes que me casei com uma aristocrata japoneza… Amo-a! Mas ela ama mais ainda o su imperador. Fanatica como é, só tem, neste momento, uma ambição: suicidar-se, rasgar o ventre como fez a mãe, durante a agonia do outro imperador… Sou obrigado a vigiá-la – como se vigia uma louca… Em casa escondi todas as facas, todas as laminas. Esta manhã tive de lhe arrancar das mãos a navalha de barba – porque queria suicidar-se com ela…

Á meia noite, o “champagne” fizera esquecer aos diplomatas de Tokio, a agonia do imperador. Riam-se em francas gargalhadas – e por um triz não tinham atacado o piano com qualquer “fox-trot” europeu…

De súbito, o ministro da Finlandia alarmou, com uma exclamação dolorosa, a alegria dos convivas. A ministra – japoneza fanática – tinha desaparecido… Aproveitara, seguramente, um instante de distração, para pôr em pratica o seu plano de suicídio…

Calaram-se os risos e todos se lançaram em busca da japoneza… O porteiro não a tinha visto saír. Os creados dos quartos e do segundo andar não a tinham visto passar. Portanto ela permanecia no terceiro…

Especaram-se todos no longo corredor, fixando as portas dos vários aposentos – tentando transparentá-las com os seus olhares anciosos…

Em que aposento se teria fechado ela? Indagava, angustiado, o marido.

E o ministro italiano apressou-se a responder:

- Se a sua ideia fixa era o suicídio, só podia ter-se fechado no…

  

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Nota: Na transcricção destes dois contos/problemas foi mantida a grafia da época (1927).

 

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DOMINGOS CABRAL DA SILVA

 »»» Publica-se aos dias 15 e último de cada mês! «««  


 

 

»»» DOIS CONTOS POR SECÇÃO!

Esta 36.ª Edição de PPPP (CORREIO POLICIAL) está conforme o conteúdo da publicação original de 21 de Maio de 2021. Próximos Contos: O RUBI ORIENTAL e UM BEIJO NAS TREVAS.

 

 

 

INFORMAMOS OS LEITORES, ESPECIALMENTE AQUELES QUE TÊM PERGUNTADO PELAS "SOLUÇÕES" DOS "CONTOS/PROBLEMAS POLICIÁRIOS", QUE NO FINAL DE TODAS AS PUBLICAÇÕES... APRESENTAREMOS AS "RESPOSTAS" (PLAUSÍVEIS), MESMO QUE RESUMIDAMENTE, ELABORADAS PELO CONFRADE "INSPECTOR ARANHA"... PELO QUE TODOS OS FÃS DESTES "PRIMÓRDIOS" DA PROBLEMÍSTICA POLICIÁRIA PODEM CONTINUAR A TOMAR NOTAS DAS SUAS PRÓPRIAS OPINIÕES... PARA, DEPOIS, COMPARÁ-LAS... COM AQUELAS DEDUÇÕES/OPINIÕES!! 

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