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domingo, 26 de outubro de 2025

O CASO (sério) DA RUA das TRINAS ☝Edições Fora da Lei Novela de Dez Episódios -- 🕵️ Oito Autores - 2018 (TPL)

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EPISÓDIO 3 – JOGOS DE PODER

Por: Detective Jeremias

 

     Os presentes, já que os ausentes estavam lá fora na praça, esboçaram um gesto para cumprir a ordem de saída. Mas ficaram todos em suspenso, como nas quebras de película dos filmes do Cinema Ideal. As carpideiras semi-sentadas, com os respectivos rotundos traseiros a um meio palmo dos assentos dos bancos corridos e com as malinhas de mão da moda – imitação autêntica de pele – espremidas contra o epigastro. Os homens estacaram, com um pé no ar e o outro no chão, numa estranha coreografia de início de marcha, agora interrompida. Quim Costa, debruçado sobre a aparentemente fenecida Isaura, permanecia em posição de estátua, esquecido das mamas completamente expostas da mulher, depois de ele lhe ter desapertado os botões de contas da fina blusa preta, numa tentativa inútil de recuperação de consciência. Novena, imóvel, braços em Cristo crucificado, aproximava perigosamente da chama das velas as arrendadas mangas de anjo do roquete que envergava e arriscava imolar-se pelo fogo.

A imobilidade criada parecia a etapa final de um insólito jogo de Macaquinho do Chinês, embora neste caso aos olhos de todos, excepto do defunto e da desfalecida, o jogador no comando se afigurasse ao King Kong. A cena durou um segundo, muito menos do que a sua descrição, foi desencadeada por um urro proferido pela figura mastodôntica, que bloqueava por completo a estreita porta da sobrelotada sala de velório. “POLÍCIA JUDICIÁRIA! NÃO VAI NINGUÉM PARA A RUA, NEM PARA A PUTA QUE OS PARIU! ESTÃO TODOS PRESOS!

Nesta insólita ocorrência, a novidade não estava na presença da Judite, na ameaça de prisão – poucos eram os que nunca tinha ido de cana – ou nas injúrias verbais, a novidade estava na ousadia da contra ordem, à ordem de Novena. Nunca ninguém na vida tivera o arrojo de desobedecer ao padre. O que ele dizia era lei para a gentes da zona: crentes, agnósticos e ateus, todos estremeciam perante a excomunhão.

Ficou suspenso o velório, o morto foi apreendido e afinal o que o gigantesco inspector vociferara só se cumpriu parcialmente: foram presos, mas depois de saírem todos para a rua. Quase todos, menos dois, porque Novena safou-se, não fosse ele um digno representante da Igreja, ficou a aconchegar as mamas da Isaura, que tardava – e se tardava…– em recuperar os sentidos.

O Largo de São Paulo estava silencioso e deserto. Quase silencioso, quase, porque o ganido metálico do carro eléctrico nocturno, da Carris de Ferro de Lisboa, furava os tímpanos daqueles que não tivessem o canal auditivo completamente obstruído por cerúmen. Quase deserto, quase, porque se bem que os amigos do falecido tivessem dado à sola, em corrida acelerada, num jogo de Toca e Foge, ou melhor de Esconde Esconde, perante a chegada da polícia, apareceram duas carrinhas de transporte e seis agentes com excesso de peso. Não fosse a ordem do hercúleo inspector Anjinho – nada como fazer jus ao nome! – para não se afastarem da entrada da igreja, estariam todos, polícias e acompanhantes do velório a brincar à apanhada pelas ruas e travessas do Cais Sodré.

A escassez de espaço nas carrinhas, pardas e sem matrícula, determinou a redução do número dos detidos. Os agentes procederam a uma criteriosa escolha das criaturas presentes, aplicando com rigor matemático uma versão adaptada “Anani, ananão / Ficas TU e TU não”. Depois de metidas as sardinhas nas latas, as carrinhas seguiram em alta velocidade – 34,6 km/h – em direcção a local desconhecido, porque a sede na Gomes Freire só seria inaugurada a 15 de Setembro de 1958, com pompa e circunstância.

Chegados ao local desconhecido, apartaram os homens das mulheres, por causa das indecências. Foram libertados de imediato aqueles que tinham em seu poder o cartão de informador da PIDE, ou provassem ser adeptos do Benfica, servia Cartão de Sócio ou de praticante de qualquer modalidade. Os restantes foram revistados, identificados, numerados e fotografados de frente e de perfil, para justificar a aquisição da Leica. Ficaram a aguardar interrogatório.

Ao mesmo tempo, no seu gabinete de trabalho, o inspector Anjinho tentava pôr as ideias em ordem. Tivera uma semana para esquecer e o homicídio do Tónecas fora o golpe final. É que o rapaz além de guarda-redes, fadista e engatatão encartado era também, a mando de Anjinho, um espião, um agente não oficializado, especializado na recolha de informações no meio local e entre os americanos de passagem.

Agora Anjinho tinha um dilema, ou melhor, um trilema, entre as manápulas: Tónecas fora vítima de crime passional, de espionagem, ou tudo não passara de um mero acidente.

Antes de dar início ao interrogatório dos detidos, os nossos conhecidos da Rua das Trinas, Anjinho deu a si próprio uma pausa. Refastelou-se na cadeira mandada fazer por medida, preparou um cachimbo. Fumou, passou os olhos globosos pelo Diário de Lisboa do dia, “Quinta-feira, 21 de Junho de 1951”, a primeira página anunciava a data limite para a apresentação das candidaturas à presidência da República, pois… finado o Carmona, tal como o Tó Gula, mas sem as facadas.

Anjinho suspirou, fazendo estremecer a papelada na secretária. Iria começar com os interrogatórios que durariam até de madrugada. Num esforço de auto motivação, honrando as suas pretensões intelectuais, afirmou entre dentes; “Alea jacta est, os dados estão lançados, ou será que é Veni, vidi, vici?”.

 


 

VOLTAREMOS NO PRÓXIMO DOMINGO, 2 de Novembro, com o Episódio n.º 4 - O INTERROGATÓRIO, por: ARNES.🧐


 


👌 FELIZ Domingo!


📔BOAS Leituras!

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