O Jornalista... SOU EU! (02)
Um olhar de criança
Escreveu: LINA REIS (LR)
As crianças são também o
reflexo dos Pais. As crianças são também o reflexo do País em que vivem, das
condições que lhes dão. As crianças de hoje são o Futuro de uma Nação.
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Á 35 anos atrás, havia uma menina
em Almada, que sonhava ser bailarina. Pediu para a inscreverem e foi-lhe
explicado que a mensalidade era cara, as roupas também. A família não poderia
comportar mais essa despesa. Foi difícil para a menina compreender porque
estava a levar esse não. Coisas relacionadas com dinheiro são difíceis de
perceber aos 6 anos. Uma amiga do prédio tinha a sorte de praticar Ballet e
quando a menina ia ver nos saraus anuais da amiga, não conseguia deixar de
sentir uma certa inveja por não ser ela a estar ali no palco.
Quando somos crianças tudo nos
parece gigantesco. Pessoas de 30 anos são velhas e imaginarmo-nos com essa
idade é futurologia. Tudo o que nos rodeia também é grande: Muros parecem
intransponíveis e uma grande nespereira parece-nos uma árvore centenária.
Quando crescemos, as coisas mudam e quando nos confrontamos com imagens do
passado, até nos surpreendemos e achamos que extrapolámos a realidade. Quando
somos crianças o mundo imaginário é igualmente gigantesco e é nele que somos
bailarinas, cantoras, professoras, cientistas e outras coisas muito improváveis
perante as nossas capacidades. É nestes sonhos infantis que delineamos o nosso
futuro, que esboçamos o adulto que seremos. Detesto ouvir que as crianças são
muito maldosas. As crianças são boas e más, como há adultos bons e maus. Os
traços de bom ou mau carácter existem, tanto na infância, como na idade adulta.
A grande diferença é que mais velhos, disfarçamos melhor. As crianças são
também o reflexo dos pais. As crianças são também o reflexo do país em que
vivem, das condições que lhes dão. As crianças de hoje são o futuro de uma
nação.
Hoje em dia, felizmente, as
oportunidades são maiores, mas continua a haver crianças menos privilegiadas em
que a prática de um desporto continua a ser um sonho. Mesmo havendo o desporto
escolar, que é uma mais-valia gratuita, continua a ser dispendioso praticar
algumas modalidades. Onde antes havia um campo de terra batida onde amigos se
juntavam para jogar futebol, agora há escolas de futebol geridas por clubes de
renome, onde se separa o “trigo do joio” e onde se fabricam jogadores,
desde a mais tenra idade. Concordo que melhores condições geram melhores
atletas. Não consigo é perceber o negócio do futebol a gerar dinheiro logo na
infância. O apoio à prática desportiva devia ser uma bandeira dos nossos
governantes. Se tivessem uma visão das vantagens a longo prazo do desporto
veriam que iríamos ter ganhos em termos de saúde mental e física no futuro, com
a diminuição de obesos, doentes cardiovasculares, adictos a drogas e
delinquência juvenil. Em vários países o desporto é usado com reabilitador de
jovens. Cada vez mais temos que nos esforçar para conseguir futuros portugueses
empreendedores, trabalhadores e válidos em vez de apostarmos numa sociedade
assistencialista, numa população de incapazes.
Durante a cerimónia de
aniversário do Charneca, ouvi um jovem jogador a dizer que até ficava triste em
deixar de ter pelado, pois era no pelado que dava cabo deles. Pois vão
estranhar se vos disser que também ficaria triste em perder o pelado, se isso
significasse transformar um clube caseiro, onde até crianças menos afortunadas
conseguem pertencer, numa nova máquina de fazer dinheiro, onde se perdem
valores. No entanto acredito que iremos conseguir as duas coisas. Podem dizer
que quero o melhor de dois mundos, mas continuo a acreditar que é possível
conseguir o sintético sem “ter de vender a alma ao diabo”. Os
nossos atletas merecem ter condições para a prática desportiva. Os nossos
atletas em breve vão ter o relvado sintético com o qual sonham há tanto tempo.
Prevendo que se vá viver
dificuldades que já tive na infância, quero pedir às nossas crianças que não
deixem de sonhar. Eu continuo a sonhar vendo que algumas delas vão ser no
futuro os governantes que precisamos para voltar a pôr as caravelas no mar e
transformar este País num ainda melhor cantinho para viver.
Lina Reis
(SUPLEMENTO DA EDIÇÃO N.º 18 de VAMOS FALAR DE
FUTEBOL…) - CCFC
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